quinta-feira, 11 de outubro de 2012

A neve nos meus cabelos...



Um forte vento gelado bateu-me na cara, acordou-me novamente. Estou cansada de caminhar, de carregar esta tristeza aos ombros. Quero descansar um pouco as pernas, nem que seja só por uns segundos. Estou exausta e começo-me a chatear até com a mínima árvore que treme de frio.
Desejo ardente, este, de te voltar a ver, meu guerreiro. Sentir as tuas mãos quentes na minha cara e os teus lábios aquecerem os meus. O que eu dava para te ver fazer uma chávena de chá... olhar-te a cara por entre os longos cabelos que te escondem a fragilidade interior. Esboçar um sorriso de completa alegria de cada vez que brincas com o nosso filho, e rir-me de ti, contigo e por ti, com um contágio que me faz arder o peito e chorar.

-- "Mais um passo... já falta pouco!"
O ambiente à minha volta pinta-se de branco e um nevoeiro cobre o horizonte que me leva a casa. O meu corpo pode fraquejar e desligar-se, mas o meu amor por ti continuará para sempre a manter quente. Porque sou emocionalmente tão estável como os braços que seguraram o nosso filho a quando da grande guerra, naquela subida íngreme à colina de Bon'z. Lutas-te por nós, para mais um dia, e hoje luto eu, sozinha contra a maior adversária que alguma vez podia escolher. A natureza não faz amigos nem acolhe ninguém.
Aprendemos a viver nela, com ela, assim me dizes vezes sem contas, meu amor...

Tenho saudades das noites em que passamos horas a olhar para as estrelas. Abraçados um no outro, separados pelo cacho mais sumarento da nossa colheita. Tenho-te saudades meu filho! A mamã não tarda em casa. Não chores meu filho, o papá está contigo e a mamã pensa em ti todos os momentos.

Uma aventura para contar ao meu filho, e aos meus netos. Uma caminhada sem fim numa memória sem validade.
A neve nos meus cabelos arrefece-me as ideias, mas não me cessa a vontade de continuar a andar. Casas-te-te com uma mulher guerreira meu homem, e aqui a tens. Uma mulher que se completa ao teu lado. Que cresce, renasce cada vez que olha para o teu sorriso, que é abraçada e tocada por ti.
Estes pensamentos começam-me a dar calores, sentir as tuas mãos descerem pelos meus peitos, passarem pelas ancas e sentir-te em mim, brincalhão.
Aquece-me, mas não posso pensar mais nisso, deixa-me com saudades a mais, faz-me sonhar e eu perco a concentração da minha caminhada. Desculpa-me meu girassol.
A barriga ronrona, e a única coisa que tenho para comer, é o que conseguir caçar. Mas está tudo tão calmo,  que o vento parece falar comigo.
Outra rajada de vento que me corta a cara, me rasga os lábios e me queima os olhos. Encolho-me nos teus braços, sinto-os apertarem-me as peles contra o corpo, mas não estás aqui... relembro a ultima vez que te vi, a acenares para mim com o nosso rebento ao colo, os dois com grandes sorrisos. Sinto uma lágrima cristalizar na minha bochecha, e um aperto no peito que me parece matar de saudade. Ironia... matar-me-á mais depressa as saudades que vos tenho, que um tempo gelado como este.
-- "A tua mãe é danada!" -- relembro eu uma frase tua, que tantas vezes lhe dizes quando me chateio contigo.
-- "A tua mãe é tola!"
Pois sou... muito! Por vocês os dois vou ao fim do mundo, irei ao inferno e volto! Por vocês serei imortal... uma esposa com um grito de guerra que fará tremer os alicerces da terra.

Sou frágil como a neve nos meus cabelos, os lábios rasgados do frio e as mãos já resfriadas, engelhadas. Uma caricia do meu homem, uma memória do meu bebé chuchar-me na mama, e encolho-me, abraço-me, sorrio e choro... aconchego-me sozinha nestas folhas que voam sobre a minha cabeça, entre arco-íris que me iluminam a alma, me fazem aninhar como um coelho ou voar como um pássaro.

A neve nos meus cabelos... são lágrimas de alegria, espalhadas ao vento, pelos meus antepassados.
Vejo as estrelas pularem no céu já adormecido.
-- "Estou perto, meus amores... A mamã está a chegar!"

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