segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Dói já não te reconhecer...



Sabes que vais morrer, e a comida já não sabe ao mesmo... o teu estômago fica mal disposto, vazio, cola-se às costas e entorse-se de fome.
Olhas-a nos olhos e a língua não se move. Não dança como antigamente. Não tens nada para lhe dizer e isso deixa-a a chorar. Deixa-a desesperada porque não percebe, não compreende, não sente.
Com uma lágrima guardada no seu olho, e um rio na palma da sua mão, a sua cara transforma-se em sangue, tentando torturar-se a si própria por uma resposta. Uma tortura que te espelha no corpo, te arrepia a espinha e sacode-te de tristeza. As suas mãos frias fecham-se como uma flor que morre sem saber, como um gira-sol se fecha ao ver o seu Sol desaparecer no horizonte enublado.
Olhas para ela e vês uma fotografia emoldurada de emoções e histórias que parecem não ter sido as vossas, que não recordas. A sua cara molhada pelas águas do desespero, de peito arranhado e cabelos docemente encaracolados à volta da sua beleza e ombros de mãe perfeita, de mulher completa, serpente-a na tua mente masculina, pelas narinas a dentro, bailando até ao teu cérebro morto e apertado. Sabes que estás a morrer, e os teus olhos já não brilham da mesma maneira mágica que a faziam correr até ti de braços abertos. Perdes o olhar nas suas pernas, nos seu pés descalços, nas mãos que teimam em não parar de tremer e numa carpete exageradamente colorida para o ambiente sufocado de silêncio.
Alimentava ela um pequeno passarinho, o seu coração, de socos e sopros, depenando-se em cacos que ajudavas a partir, a espalhar. A tua cara ardeu e a mão dela vibrou. Trocaram olhares como à muito não trocavam presentes, sorrisos, caricias, beijos, a cama...

Dói já não te reconhecer. Dói já não te saber ler e tu... saberes ouvir.

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