terça-feira, 25 de junho de 2013

O momento em que respirei pela primeira vez...


Desde o momento em que respirei pela primeira vez, os meus pulmões encheram-se de esperança. Recebi o "dom" da sobrevivência. Fui condecorado e aplaudido de entre os milhões que me acompanhavam no seu ultimo momento de vida.
Chorei, berrei, esperneei e gritei em plenos pulmões, um grito de guerra, que tinha jurado fazer-se ouvir desde o grão microscópico que me constrói e envolve. As mãos tinham força suficiente para agarrar o ar, mas também a vida, pelos colarinhos, o vento e os sentimentos. De apertar-lhe os ossos com força e mostrar o ferro de que sou feito. Os olhos castanhos comuns, iriam ver o mundo e as pessoas de uma maneira completamente diferente. As orelhitas entretiam-se com a voz de embalar da mãe, com os pijamas e o timbalalão (cabeça de cão, orelhas de gato, não tem coração).

Não sou um, são milhões, com perspectivas e objectivos diferentes. Guerreiros do passado que se preparam para a batalhada do futuro. Cada parte de mim foi desenhada para sobreviver, para lutar e trepar. Cada parte de mim é irracional, não possui tempo mas uma história. Um caos lutador que luta, que se levanta e repara. Uma sopa caótica de gerações e hereditariedades, de experiências que se juntaram numa pequena caixa. O meu corpo grita, rasga e esperneia, na tentativa de hoje conseguir agarrar a vida pelas roupas, de a apertar e segurar nos braços com convicção suficiente para a fazer perceber de que se também ela quer uma vida "fácil", que não me aperte demasiado os atacadores dos sapatos e me invoque os joelhos ao chão demasiadas vezes. Pedir ao vento para que as chapadas não sejam tão fortes e frias como as de agora. Que a natureza me deixe respirar, descansar e sonhar de alivio.

Voltar à tona de água, e sentir um fervilhar percorrer-me o corpo, como se não respirasse à centenas de anos, apesar de nunca ter esquecido como se fazia. O oxigénio apertava contra as costelas os pulmões roxos pela fome do grito da vida. Pelas ordens dos milhões de músculos, de sentir nas pernas os músculos correrem por mim, e as mãos penetrar o inimigo.

No momento em que respirei pela primeira vez, o território desconhecido e inalcançável, era irrelevante. Todos os estímulos, todas as palavras, todas as memórias, tinham um tempo de vida muito inútil. A inocência da minha mente frágil, esponja e muito carente, é agora, um caderno já velho, um pouco mal cuidado como as guerras que já combati e perdi. Tivesse eu nunca nascido, desconhecer o passado e o futuro, e o presente seria mais tolerável, mais fácil, mais interessante. A dificuldade do jogo muda. Sou eu quem o mudo, não é o mundo ou a vida, pois esses ainda os seguro com força. Acredito eu. Um ser incapaz, que até na coisa mais comum do mundo, respirar, o faz mal.
As guerras da respiração, o deslumbre ao abrir dos olhos sobre as paisagens de perder a vista e a fala, envelhecem com o tempo, escondendo-se cansados, na escuridão mais triste e sossegada das minhas conversas, das minhas memórias e experiências.

A primeira vez em que parei de lutar, percebi que não queria lutar sozinho, mas ao lado de alguém como tu, que vale a pena. Que me faz sorrir e esforçar. Agarrar nos meus sonhos como uma espada e correr pelo campo fora, de peito e cabeça erguidos. De te agarrar pela mão e criarmos juntos algo extraordinário. Porque foi no momento em que respirei pela primeira vez, que não fazia sentido viver tão longe de e sem ti. Acompanhas-me a voz e ajuízas a mente ainda criança. E se errar é uma maneira de dizeres "está atento", então direi que tens uma paciência extraordinária e uma mente ainda mais bela.


Bastou um momento para saber quem tu eras.

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Lengalengas

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